Dorival Gonçalves dos Santos, de 32 anos, passou quase um terço da vida recolhendo lixo para sobreviver e agora está prestes a concluir o doutorado em uma universidade pública. Ele iniciou o trabalho no lixão em sua cidade natal (Piedade, no interior de São Paulo), para auxiliar a família, que vivia em condições precárias. “Nessa época, eu ainda não tinha noção de tudo o que faltava, mas a gente passava fome. Fiquei doente, acho que por desnutrição”, lembra.
No período em que trabalhou como catador de material reciclável, Dorival se sentia invisível diante da sociedade. “Nesta época, percebi o quanto éramos invisíveis aos olhos de todo o mundo. Nem mesmo os lixeiros dos caminhões olhavam para a gente.”
Apesar da convivência diária com a sensação de invisibilidade, o lixão lhe despertou a paixão pelos livros. Silva recolhia os volumes que apareciam lá e os lia nas horas de folga. Chegou a juntar cerca de três mil exemplares, com a colaboração de colegas que também trabalhavam no local.
“Guardava todos que encontrava e pedia para colegas me darem aqueles que achavam. Era impressionante a quantidade de livros que apareciam no lixão, desde infantis até clássicos da literatura e publicações voltadas para vestibulandos”.
O gosto pela leitura foi incentivado pela mãe, que só estudou até a 4ª série, mas o presenteava com gibis velhos. “Quando a gente lê muito, começa a sonhar. Eu tinha sonhos de sair do lixão, do país, não via perspectiva nenhuma aqui, mas esses sonhos foram ficando para trás porque eu precisava trabalhar”, conta.
A guinada começou quando as condições da família começaram a melhorar. Nesta época, ele tinha 20 anos e pôde se “dar ao luxo” de voltar para a escola, dividindo seu tempo entre o lixão e o estudo. Incentivado pelas professoras, no final de 2006 fez a prova da Unesp (Universidade Estadual de São Paulo). O curso escolhido não poderia ser outro: Letras.
Foi assim que, em 2011, Santos se tornou o primeiro integrante da família a concluir a graduação. Com o diploma, ele seguiu para Santa Catarina para encontrar os parentes, que haviam se mudado para o Estado. Lá, chegou a dar aulas por três meses, até ser aprovado no mestrado em Linguística da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), em agosto daquele ano. Em 2013, concluiu o curso e voltou a dar aulas por seis meses, até ingressar no doutorado na mesma área, com foco em semântica.
“As pessoas dizem que sou um exemplo. Mas eu não consigo me ver dessa forma. Penso em ser um bom pesquisador e, quem sabe, um dia, falar sobre a minha história, mostrar que o país mudou e que é possível pessoas antes invisíveis se tornarem protagonistas”.
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